Resolvi retomar a escrita para dizer sobre alguns pensamentos e situações que me levam diariamente a escolher a prática da Alimentação Viva, que venho fazendo há 08 meses.
Pensei neste texto mais como um convite à reflexão do que um relato de experiência. Eu tenho um pouco de preguiça de contar a minha história. Lá no fundo eu sei que, por mais que a gente se inspire na trajetória de alguém para transformar a nossa, o mais provável mesmo é que na nossa vez seja tudo diferente. Daí, depois de um tempo, e com a vivência da nossa própria caminhada, as histórias que a gente ouviu até parecem mentira, né verdade?!
Desde o início eu me propus a compartilhar esta prática do meu cotidiano e passei a publicar fotos, receitas e aprendizados no meu instagram (@amandalaprado). Isso me ajudou muito no meu comprometimento. Porque a gente é bem besta mesmo, e se compromete mais com as outras pessoas do que com nós mesmas.
Assim eu também aprendi a nunca mais criticar quem posta foto do prato da salada e não diz que era só a entrada do PF. Pra mim, postar a foto da salada me ajuda a voltar a ela no dia seguinte, mesmo quando eu como pizza no jantar. Eu escolhi começar pelo compromisso com a imagem que os outros fazem de mim, para em seguida melhorar e aprofundar o compromisso que eu sei que devo ter comigo. Este é um trabalho vitalício.
Recentemente topei também o desfio de compartilhar essa trajetória em um curso, que vai acontecer a partir de abril de 2018 na Casa de Cultura da Vila Guilherme, na zona norte, em que vou estar na companhia do +Michel Yakini, que muito tem me ajudado nessa busca (em coletivo é sempre mais fácil, gente. Cola com noiz!).
Assim, já que a prática está alcançando novas áreas da vida, passei a pensar em uma pergunta que é muito recorrente: Como eu comecei?
Na busca por uma resposta eu vasculhei minha vida. Tentei me lembrar quando e porque deixei de comer carne vermelha? Como consegui engordar mais de 20 quilos sem perceber? Quantos remédios eu tomei e quantas dietas antes desse sobrepeso e sem a menor necessidade? E todas aquelas questões de baixa auto-estima, ostentação depois da escassez que toda negra, periférica vive, já viveu ou viverá, ferveram na minha cabeça.
Eu me lembro bem do dia em que eu resolvi experimentar um preparo diferente dos alimentos, lembro o que cortei e o que incluí primeiro. Mas agora eu sei que não foi assim que eu comecei. Esta pergunta ficou curtindo na minha caxola até que hoje eu entendi, penso que finalmente entendi, que o processo que me trouxe até aqui tem menos a ver com escolher o que vou almoçar e jantar e mais a ver com o que carrego como valores para a minha vida.
Todas e todos temos valores que nos balizam na escolha do que é bom e o que é não é. Tem alguns valores que a gente consegue realizar, e tem outros que só geram expectativa. Eu mesma tenho como valor ter uma casa livre de poeira. Mas não tenho tempo, energia ou capacidade de manter tudo limpo o tempo todo. Penso que ninguém é capaz de manter o topo do armário limpo e a sanidade mental em dia ao mesmo tempo. Mas fico feliz toda vez que consigo incluir o topo do armário e os livros na faxina. É um valor meu, fazer o que?!
Mas tem outros valores que desenvolvi, por muitos motivos, e que influenciam nas minhas escolhas alimentares também. Desde que eu saí da casa da minha mãe eu sempre prezei por fazer minha comida. Porque não tenho dinheiro para comer fora todo dia, porque eu gosto de ir à feira, porque eu gosto de preparar comida, porque eu gosto de compartilhar comida.
Como eu aprendi olhando a medida de cozinhar para quatro na casa da minha mãe, nunca consegui fazer um prato só pra mim. Disso se desenvolveu a necessidade de cuidar e armazenar a comida. Então, o dia da feira sempre foi o dia de lavar e secar saladas e temperos, fazer marmitas, separar e congelar porções. Descobri que cuidar da minha comida sempre foi um valor pra mim, e que aprendi só de olhar.
Então talvez eu tenha começado fazendo mamadeira para o meu irmão mais novo, ou esquentando a comida na hora certa para os meus irmãos almoçarem antes de ir pra escola. Eu posso ter começado intuitivamente deixando de gostar do sabor do bife, mesmo ele sendo uma raridade comemorada na mesa naquela época. Eu posso ter começado quando me intriguei porque meus amigos vegetarianos não comiam nem queijo, comiam o que então?
Tenho descoberto a cada dia que a Alimentação Viva é uma prática de vida, que está se afluindo nos meus diversos canais de criação. E assim é porque é simples. Não existe maneira mais simples de se alimentar do que a de não mais cozinhar. É um princípio bem básico, mas que não funcionaria se eu não tivesse o ato de me alimentar como um valor.
Quando falo sobre se alimentar, é sobre tudo o que você põe pra dentro, não importa qual seja a sua dieta. Se você quer começar alguma mudança e deseja que ela seja profunda, libertadora e permanente em sua vida, é necessário observar como você se relaciona com o objeto a ser mudado. Que valores regem isso na sua vida? São valores que você pratica ou são estes que só complicam?
Foi nesse ponto que cheguei nessa reflexão, Brasil. Espero que você não se desanime com tanta história. Se você está a fim só de provar, sem compromisso, experimente, descubra pro si própria seu caminho. Não tem opção melhor ou pior entre experimentar uma coisa nova ou mudar profundamente uma prática, mas fazer a escolha com presença e consciência é um ótimo jeito de começar.

